Pedido de Parecer - Presidente da Junta de Freguesia - Meio tempo
I - O pedido:
Esta CCDR Algarve, I.P. recebeu da Junta de Freguesia de …, através de email de 16 de abril de 2024, o seguinte pedido de parecer:
“O Senhor presidente desta junta de freguesia é aposentado da CGA e está em funções desde outubro de 2021. Desde janeiro de 2022 acumula a pensão com a remuneração fixada para autarca a meio tempo (atualmente €655,52).
Entendeu-se que o senhor presidente não se encontra abrangido pelos “limites às cumulações” a que se refere o artigo 9.º, nem está incluído na lista de cargos políticos constante do artigo 10.º da Lei n.º 52-A/2005, na sua atual redação.
Contudo, surgiu a dúvida se o senhor presidente estava obrigado a descontar para a segurança social sobre a remuneração a meio tempo. Foi enviado pedido de esclarecimento para a CGA.
A CGA na sua resposta mencionou que a consequência do exercício de funções é a suspensão obrigatória da pensão. (…)
Pode o senhor presidente acumular a pensão com a remuneração a meio tempo?
Está obrigado a descontos para a segurança social?”
II - Análise:
a) Quanto à cumulação da pensão:
Os aposentados (subscritores da CGA) ficam sujeitos a um regime de incompatibilidades e de cumulação da pensão com atividade remunerada, previsto nos artigos 78.º e 79.º do Estatuto da Aposentação (versão consolidada).
De acordo com este regime não podem exercer atividade profissional remunerada para quaisquer serviços da administração central, regional e autárquica, empresas públicas, entidades públicas empresariais, entidades que integram o setor empresarial regional e municipal e demais pessoas coletivas públicas, exceto quando haja lei especial que o permita ou quando, por razões de interesse público excecional, sejam autorizados pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública.
No entanto, tal como tem sido interpretação uniforme, transmitida em vários pareceres das CCDR, I.P.[1], o regime previsto no Estatuto da Aposentação incide sobre o exercício de funções públicas e a prestação do trabalho remunerado, que são distintos do exercício das funções autárquicas, consideradas “políticas e eletivas”[2].
Concluindo-se, assim, que o regime de incompatibilidade e condicionalismos em causa não tem aplicação no caso dos eleitos locais, uma vez que estes são membros dos órgãos deliberativos e executivos dos municípios e das freguesias, nos termos do artigo 1.º do Estatuto dos Eleitos Locais, aprovado pela lei n.º 29/87, de 30 de junho (versão atual).
Neste seguimento, é de aplicar o regime relativo a pensões e subvenções dos titulares de cargos políticos e o regime remuneratório dos titulares de cargos executivos de autarquias locais, aprovado pela Lei n.º 52-A/2005, de 10 de outubro (versão atual), remetendo-se para o disposto nos seus artigos 9.º e 10.º:
Nos termos do n.º 1 do artigo 9.º, o exercício de quaisquer funções políticas ou públicas remuneradas por pensionista ou equiparado ou por beneficiário de subvenção mensal vitalícia determina a suspensão do pagamento da pensão ou prestação equiparada e da subvenção mensal vitalícia durante todo o período em que durar aquele exercício de funções.
O n.º 2 do mesmo artigo refere que o disposto no número anterior abrange, nomeadamente:
a) O exercício dos cargos de Presidente da República, Presidente da Assembleia da República, membro do Governo, Deputado à Assembleia da República, juiz do Tribunal Constitucional, Provedor de Justiça, Representante da República, membro dos Governos Regionais, deputado às Assembleias Legislativas das regiões autónomas, deputado ao Parlamento Europeu, embaixador, eleito local em regime de tempo inteiro, gestor público ou dirigente de instituto público autónomo;
(sublinha-se a parte que releva para a análise)
Por sua vez, o artigo 10.º enumera, para efeitos de aplicação deste regime, quais são os titulares de cargos políticos a ter em consideração:
a) Os deputados à Assembleia da República;
b) Os membros do Governo;
c) Os Representantes da República;
d) O Provedor de Justiça;
e) Os governadores e vice-governadores civis;
f) Os eleitos locais em regime de tempo inteiro;
g) Os deputados ao Parlamento Europeu;
h) Os juízes do Tribunal Constitucional que não sejam magistrados de carreira.
i) Os membros dos Governos Regionais;
j) Os deputados às Assembleias Legislativas das regiões autónomas.
(sublinha-se a alínea que releva para a análise)
Face ao quadro legal sublinhado, no caso de eleitos locais em regime de tempo inteiro, existe incompatibilidade do recebimento da pensão de aposentação e da subvenção mensal vitalícia durante o período de exercício de funções políticas.
No entanto, quanto aos eleitos locais que exercem o mandato em regime de meio tempo, conclui-se que estes não estão incluídos no artigo 9.º e não constam do elenco dos cargos políticos do artigo 10.º da Lei n.º 52-A/2005 (redação atual), pelo que podem acumular a sua aposentação ou reforma com a remuneração a meio tempo, prevista no artigo 5.º da Lei n.º 11/96, de 18 de abril (redação atual) e n.º 8 do artigo 27.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro (redação atual)[3].
b) Quanto aos descontos:
Sobre esta matéria, considera-se de remeter a entidade consulente para as orientações divulgadas pela Direção-Geral das Autarquias Locais, DGAL[4], sobre as remunerações e encargos dos eleitos locais, em particular sobre o Meio Tempo, e que a seguir melhor se identificam:
“REMUNERAÇÕES ELEITOS LOCAIS
Remunerações dos Eleitos Locais pelo Orçamento do Estado
(art.º 27.º, n.os 1 e 2 da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro e art.º 10.º da Lei n.º 11/96)
(…)
“II. Meio Tempo – nas restantes freguesias, os presidentes das juntas de freguesia podem exercer o mandato em regime de meio tempo e têm direito a metade da remuneração fixada para os respetivos cargos em regime de tempo inteiro. Neste caso, os presidentes das juntas de freguesia, têm direito, nos termos da Lei n.º 11/96, de 18 de abril e do n.º 8 do artigo 27.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, ao pagamento pelo Orçamento do Estado de:
i) Remuneração, deduzida da compensação mensal para encargos (artigo 5.º);
ii) Dois subsídios extraordinários anuais de montante igual à remuneração (artigo 6.º);
iii) Encargos com a Segurança Social - varia de acordo com a situação laboral do eleito local (respeita ao encargo com a Segurança Social ou Caixa Geral de Aposentações que deve ser pago pela freguesia, e corresponde no máximo a 23,75% da remuneração, nos termos do n.º 3, art.º 5.º da Lei 29/87, de 30 de junho).”
No quadro destas orientações, a remuneração correspondente ao meio tempo fica sujeita aos encargos para a Segurança Social, porquanto o desempenho do mandato neste regime está sujeito a obrigação contributiva para a segurança social, de acordo o n.º 3 do artigo 5.º Estatuto dos Eleitos Locais, aprovado pela Lei 29/87, de 30 de junho (redação atual)[5], cujos encargos são suportados pelo Orçamento de Estado, conforme estabelecido no n.º 1 do artigo 10.º da Lei n.º 11/96 ( versão atual) e no artigo 54.º da Lei do Orçamento para 2024, Lei n.º 82/2023, de 29 de dezembro.
III – Conclusões:
- O Senhor Presidente da junta de Freguesia aposentado, em exercício do mandato em regime de meio tempo, poderá acumular a pensão com a remuneração aplicável ao exercício do mandato dos membros das juntas de freguesia, prevista no artigo 5.º da Lei n.º 11/96, de 18 de abril (redação atual) e n.º 8 do artigo 27.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro (redação atual), porque os eleitos locais neste regime não estão incluídos no artigo 9.º e não constam do elenco dos cargos políticos do artigo 10.º da Lei n.º 52-A/2005, de 10 de outubro (versão atual);
- Em regime de meio tempo fica sujeito ao pagamento das contribuições para Segurança Social, porque está obrigatoriamente abrangido pelo Regime Geral de Segurança Social, nos termos do n.º 3 do artigo 5.º da Lei n.º 29/87 de 30 de junho (na redação atual).
[1] Destacam-se os seguintes pareceres: da CCDR Norte, I.P. n.º INF_DSAJAL_LIR_4847/2022, de 06-10-2022. disponível para consulta na página desta CCDR, I.P., em: Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte, IP - Pareceres Jurídicos (ccdr-n.pt) e da CCDR Centro, I.P., Informação DSAJAL 236/2022, de 31 de maio de 2022, disponível para consulta na página da CCDR Centro, I.P. em: Informação (ccdrc.pt).
[2] Cf. o parecer da CCDR Norte, I.P. identificado na nota anterior: na sequência de uma reunião de coordenação jurídica, entre a DGAL e as CCDR, realizada no dia 18-01-2011, e após audição da DGAEP, a DGAL publicou umas FAQ, contendo uma resposta sobre a não aplicabilidade do regime de incompatibilidades do artigo 78.º do Estatuto da Aposentação, considerando as funções de eleito local “políticas e eletivas”.
[3] Em reforço desta interpretação, conclui-se no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 13.03.2019 (Processo n.º 01074/18.3BELSB):
“I – O art.º 10.º, da Lei n.º 52-A/2005, de 10/10, na redação resultante da Lei n.º 83-C/2013, de 31/12, deve ser interpretado no sentido que, para efeitos de aplicação da lei, se consideram titulares de cargos políticos aqueles que aí estão enumerados, bem como os que são indicados na al. a) do n.º 2 do art.º 9.º e que não constam desse elenco.
II – Tendo o legislador especificado que abrangidos pela Lei n.º 52-A/2005 eram os “eleitos locais em regime de tempo inteiro”, afastou, “a contrario”, qualquer outra categoria de eleitos locais, não se podendo estender o sentido da norma de forma a abarcar os eleitos locais em regime de meio tempo, apesar de estes também serem titulares de cargos políticos remunerados.
III – Assim, os limites à cumulação constantes do n.º 1 do referido art.º 9.º não são aplicáveis aos vereadores das câmaras municipais que exercem funções em regime de meio tempo.”
[4] Em: Portal Autárquico - Remunerações Eleitos Locais (dgal.gov.pt)
[5] Por força da alteração introduzida pelo artigo 399.º da Lei n.º 2/2020, de 31 de março.