Suspensão do Plano Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios para efeito único de aprovação dos projetos RERAEsuspensão do Plano Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios para efeito único de aprovação dos projetos RERAE
Sobre o assunto em epígrafe deu entrada nesta CCDR Algarve um pedido de parecer jurídico subscrito pela Sra. Vereadora da Câmara Municipal de …… através de ofício n.º 3593, de 29.04.2021 que mereceu o número de entrada nestes serviços E03433-202105 de 04.05.2021, no qual em síntese refere que:
I
1 – No âmbito do regime excecional de Regularização de Atividades Económicas (RERAE), a Câmara Municipal de ….. tramitou e viabilizou uma série de processos de regularização, os quais vieram a determinar uma série de alterações ao Plano Diretor Municipal de ….. (PDM) conforme aviso n.º 18878/2020, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 19 de novembro;
2 – O atual Plano Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndio (PMDFCI) de 2.ª geração foi aprovado pelo ICNF em 19 de fevereiro de 2018;
3 – Pese embora a alteração efetuado ao PDM referida em 1, a aplicação do n.º 2 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 124/2006, de 28 de junho, na sua atual redação, face à carta de perigosidade que integra o PMDFFCI, impede o licenciamento das atividades ao abrigo do RERAE;
4 – Pelo que a aprovação dos processos RERAE constituem “circunstâncias excecionais resultantes de alteração significativa das perspetivas de desenvolvimento económico e social” que justificam a suspensão do PMDFCI.
Vejamos
II
Como é sabido o Decreto-Lei n.º 165/2014, de 5 de novembro (RERAE) estabelece, com caráter extraordinário, o regime de regularização e de alteração e ou ampliação de estabelecimentos e explorações de atividades industriais, pecuárias, de operações de gestão de resíduos e de explorações de pedreiras incompatíveis com instrumentos de gestão territorial e ou condicionantes ao uso do solo.
Com efeito, este diploma veio instituir um mecanismo que permitisse avaliar a possibilidade de regularização de um conjunto significativo de unidades produtivas que não dispondo de título de exploração ou de exercício válido face às condições atuais da atividade, designadamente por motivo de desconformidade com os planos de ordenamento do território vigentes ou com servidões administrativas e restrições de utilidade pública, bem como aqueles estabelecimentos e explorações que, dispondo de título válido de exploração ou de exercício, estão impossibilitados de proceder à sua alteração ou ampliação, também por força de condicionantes atinentes ao ordenamento do território supervenientes à sua instalação.
No quadro destes objetivos, a CM… levou a cabo o processo de regularização de uma série de atividades que melhor constam no ANEXO I do Aviso n.º 18878/2020 de 19.11, publicado no D.R. 2.ª série, bem como as alterações ao Regulamento do Plano Diretor Municipal de …...
Relativamente ao aduzido em 3, ou seja, que a carta de perigosidade do PMDFCI de ….. impede o licenciamento das atividades sujeitas a RERAE por força do n.º 2 do artigo 16.º do Decreto–Lei n.º 124/2006, de 28 de junho, na sua atual redação dir-se-á o seguinte:
O n.º 2 do artigo 16.º do Decreto-Lei referido dispõe: “Fora das áreas edificadas consolidadas, não é permitida a construção de novos edifícios nas áreas classificadas na cartografia de perigosidade de incêndio rural definida no PMDFCI como de alta e muito alta perigosidade, sem prejuízo do disposto no número seguinte.”
Desde logo, do elemento literal desta norma decorre que a mesma interdita a construção de novos edifícios nas áreas classificadas na cartografia de perigosidade de incêndio rural definida no PMDFCI como alta e muito alta perigosidade fora das áreas edificadas consolidadas, sem prejuízo do número seguinte – sublinhado nosso.
Ora, como é bom de ver, o RERAE unicamente abrange estabelecimentos pré-existentes ou suas ampliações onde se desenvolvem atividades a regularizar (com edificações pré-existentes ou novas) pelo que o n.º 2 do artigo 16.º tem a sua aplicabilidade nestes casos, conjugado com o n.º 11 do mesmo artigo.
Por outro lado a parte final do n.º 2 do artigo 16.º ao excecionar o disposto no número seguinte, convoca-nos para a redação do seu n.º 3 que dispõe: “No âmbito dos planos municipais ou intermunicipais de ordenamento do território, podem ser previstas novas áreas para as finalidades identificadas nos n.os 10 e 13 do artigo anterior, bem como a ampliação de áreas já existentes com esses fins.”
Se no n.º 10 do artigo 16.º o legislador veio contemplar especificamente as edificações existentes abrangidas expressamente pelo RERAE condicionadas pelos PMDFCI, como antes referido, no seu n.º 11 possibilita a legalização de novos edifícios, cujas condições já foram por um lado acauteladas em sede de RERAE e, por outro, sê-lo-ão nos projetos de licenciamento específicos.
Nestes casos, por deliberação da câmara municipal podem ser dispensadas as condições previstas nos n.os 4 a 8 do mesmo artigo desde que o seu cumprimento se tenha tornado inviável e sejam propostas medidas adequadas de minimização do perigo de incêndio, objeto de parecer favorável da comissão municipal de defesa da floresta (CMDF).
III
Relativamente à proposta de suspensão do PMDFCI alvitrada no ponto 6 do ofício da CM…. dir-se-á o seguinte:
Os Planos Municipais de Ordenamento do Território (PMOT) são instrumentos de planeamento territorial de cariz regulamentar, aprovados pelos municípios, e que estabelecem o regime do uso do solo, através da sua classificação e qualificação, seguindo as diretrizes estabelecidas pelo Programa Nacional de Ordenamento do Território (PNOT) e pelos Planos Regionais de Ordenamento do Território (PROT) e planos intermunicipais, caso existam. Estes devem definir modelos de evolução previsível de ocupação humana e de redes e sistemas urbanos, parâmetros de aproveitamento do solo e garantia da qualidade ambiental.
A legislação em vigor define três tipos de PMOT (n.º 5 do art.º 2.º do RJIGT): Plano Diretor Municipal (PDM), Plano de Urbanização (PU) e Plano de Pormenor (PP). As diferentes figuras dos PMOT, com as suas diferentes finalidades e distintos âmbitos de intervenção, revelam-se instrumentos fundamentais para a gestão local e quotidiano da população e do território.
O principal objetivo destes instrumentos é a qualificação do território, tendo sempre presente a utilização sustentável dos recursos territoriais e a criação de um quotidiano que permita contribuir positivamente para a qualidade de vida dos cidadãos, bem como para o desenvolvimento social, económico e cultural.
A Portaria n.º 53/2019, de 11 de fevereiro, aprovou o Programa Regional de Ordenamento Florestal do Algarve (PROF ALG), publicando em anexo o seu regulamento e carta síntese. Os programas regionais de ordenamento florestal (PROF) são instrumentos de política setorial de âmbito regional (vide n.ºs 1 e 2 do artigo 39.º do Decreto-Lei n.º 80/2015 de 14 de maio) que vinculam as entidades públicas e direta e imediatamente os particulares relativamente a normas legais e regulamentares em matéria de recursos florestais (artigo 46.º da Lei n.º 31/2014, de 30 de maio). A concretização destes programas setoriais a nível municipal e no que se refere à minimização dos riscos de incêndio é assegurada através dos chamados Planos Municipais de Defesa da Floresta contra Incêndios, objetivo este constante da alínea a) do n.º 3 do artigo 4.º do PROF ALG.
Os PMDFCI não se confundem com os PMOT, que como já referimos são instrumentos que estabelecem regras de ocupação, transformação e utilização do solo através da sua classificação e qualificação, seguindo as normas próprias do Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 80/2015 de 14 de maio.
Salvo melhor opinião, o recurso à analogia no que tange à suspensão dos planos constante do artigo 126.º do RJIGT está coartada para os PMDFCI face ao princípio da legalidade a que a atividade administrativa está vinculada, tanto mais que existem disposições específicas no sistema nacional de defesa da floresta contra incêndios aprovado pelo Decreto-Lei n.º 124/2006, de 28 de junho, na versão atual, que acomodam as pretensões decorrentes do RERAE.
É o que sobre o solicitado se nos oferece.
À consideração superior,
O Técnico Superior