Atualização extraordinária do preço dos contratos de aquisição de serviços de limpeza

I – O PEDIDO

O Município de …, através do Ofício de 28-01-2022, com a referência S-CMA/2022/1101 e registado sob o n.º E05295-202107-AUT, de 01-02-2022, solicitou parecer jurídico sobre a atualização extraordinária do preço do contrato de aquisição de serviços de limpeza das Escolas EB1 e EB2,3 daquele Município, celebrado a 31-07-2019 e válido até 31-07-2021, relativamente aos anos de 2020 e 2021, colocando as seguintes questões:

  1. A atualização extraordinária prevista na Portaria n.º 605-B/2021 será aplicável ao contrato em análise, tendo em conta que o mesmo se não acha já em vigor?
  2. No caso de se responder afirmativamente à primeira questão, se, cumpridos os requisitos decorrentes da análise financeira que haja de ser feita, será admissível a atualização extraordinária dos preços praticados em 2020, por referência ao valor do RMMG fixado pelo Decreto-Lei n.º 109-A/2020, de 31 de dezembro?

 

II – QUADRO NORMATIVO

Diplomas e esclarecimentos aplicáveis:

- Código do Procedimento Administrativo (CPA);

- Código dos Contratos Públicos (CCP);

- Constituição da República Portuguesa (CRP);

- Decreto-Lei n.º 62/2013, de 10 de maio, que estabelece medidas contra os atrasos no pagamento de transações comerciais, e transpõe a Diretiva n.º 2011/7/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de fevereiro de 2011;

- Decreto-Lei n.º 167/2019, de 21 de novembro, que atualiza o valor da retribuição mínima mensal garantida para 2020;

- Decreto-Lei n.º 109-A/2020, de 31 de dezembro, que fixa o valor da retribuição mínima mensal garantida para 2021;

- Orçamento do Estado para 2020 aprovado pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março;

- Orçamento do Estado para 2021 aprovado pela Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro;

- Portaria n.º 605-B/2021, de 15 de novembro, que estabelece a atualização extraordinária do preço do contrato de aquisição de serviços de limpeza e de serviços de refeitório com duração plurianual.

 

III - O PARECER

As regras estabelecidas pelo art.º 74.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro (Orçamento do Estado para 2021), sob a epígrafe “Atualização extraordinária do preço dos contratos de aquisição de serviços” e regulamentadas pela Portaria n.º 605-B/2021, de 15 de novembro, têm na sua génese, certamente, o princípio do “equilíbrio financeiro dos contratos de índole administrativa”. Este princípio fundamenta-se na necessidade de manter as bases económicas inerentes à realização, pelos cocontratantes, das prestações contratuais vigentes à data da celebração do contrato em obediência ao princípio da “justa equivalência das prestações”, isso é, na manutenção da realidade económico-financeira na qual se fundou a adesão das partes contratantes.

Quanto à primeira questão, do âmbito de aplicação deste regime extraordinário consta, entre outros, os contratos aquisição de serviços de limpeza com duração plurianual, celebrados em data anterior a 1 de janeiro de 2021, não constando a situação da vigência do contrato como premissa para a sua aplicabilidade.

Os requisitos/condicionantes cumulativos dos contratos abrangidos por este regime extraordinário são:

  1. Tipologia de contratos: aquisição de serviços;
  2. Tipo de serviços: serviços de limpeza e serviços de refeitórios;
  3. Vigência do contrato: com duração plurianual;
  4. Data da celebração: em data anterior a 1 de janeiro de 2021 ou, no caso de terem sido celebrados após aquela data, as propostas que estiveram na sua origem tenham sido apresentadas em data anterior a 1 de janeiro de 2021;
  5. Fator determinante na formação do preço contratual: componente de mão-de-obra indexada à Remuneração Mínima Mensal Garantida (RMMG);
  6. Impactos da atualização da RMMG no preço contratual: impactos substanciais que configuram uma alteração não coberta pelos riscos próprios do contrato.

Para além destes requisitos, para que a atualização extraordinária do preço destes contratos possa ocorrer é necessário verificar:

  1. Que o requerimento tenha sido apresentado até ao dia 31-12-2021;
  2. Que o requerimento seja acompanhado de um relatório financeiro subscrito pelo contabilista certificado do requerente, que demonstre que o preço contratual sofreu impactos substanciais decorrentes da atualização do valor da RMMG para 2021, não estando esta alteração coberta pelos riscos próprios do contrato.

Desta feita, facilmente se conclui que o contrato em questão está abrangido pelo âmbito deste regime extraordinário e, caso a apreciação do requerimento conclua que o preço contratual acordado sofreu uma alteração não coberta pelos riscos próprios do contrato, os efeitos do deferimento retroagem a 1 de janeiro de 2021, abrangendo o período desde esta data até 31 de julho de 2021 (data da cessação do contrato).

Face aos prazos legalmente definidos para a apreciação (15 dias[1]: n.º 1 do art.º 4.º da Portaria n.º 605-B/2021, de 15 de novembro) e para a decisão (15 dias úteis1: n.º 2 do art.º 5.º conjugado com o art.º 6.º, ambos da Portaria n.º 605-B/2021, de 15 de novembro), há que ter em atenção quanto ao prazo para pagamento, por forma a não se incorrer no dever de pagamento de juros de mora, independentes de interpelação (n.º 4 do art.º 5.º do Decreto-Lei n.º 62/2013, de 10 de maio).

Quanto à segunda questão, se será admissível a atualização extraordinária dos preços praticados em 2020, por referência ao valor do RMMG fixado pelo Decreto-Lei n.º 109-A/2020, de 31 de dezembro, a resposta não poderá ser outra: Não. Vejamos:

Fixando o Decreto-Lei n.º 109-A/2020, de 31 de dezembro, o valor da retribuição mínima mensal garantida para 2021, uma eventual atualização extraordinária dos preços praticados em 2020 só poderia ser efetuada tendo como referência o valor da RMMG fixado pelo Decreto-Lei n.º 167/2019, de 21 de novembro.

Sendo uma realidade que o art.º 70.º da LOE 2020 estatui uma norma para 2020 igual à estatuída pelo art.º 74.º da LOE 2021 e que, efetivamente, ocorreu um aumento do valor da RMMG em 2020 (Decreto-Lei n.º 167/2019, de 21 de novembro), não é despiciendo o facto de artigo 70.º da LOE 2020 não ter sido regulamentado, conforme determinado pelo seu número 2.

E da não regulamentação do art.º 70.º da LOE 2020 decorre a impossibilidade de se proceder à atualização extraordinária dos preços praticados em 2020 face ao princípio da legalidade (art.º 3.º do CPA).

 

IV – CONCLUSÃO                                      

Face ao exposto, conclui-se que:

  1. Caso a apreciação do requerimento conclua que o preço contratual acordado sofreu uma alteração não coberta pelos riscos próprios do contrato, a atualização extraordinária do preço prevista no art.º 74.º da LOE 2021 aplica-se ao contrato de aquisição de serviços de limpeza das Escolas EB1 e EB2,3, com efeitos a 1 de janeiro de 2021 e abrangendo o período de vigência do contrato (até 31 de julho de 2021, data da cessação do contrato);
  2. A atualização extraordinária do preço prevista no art.º 74.º da LOE 2021 não se aplica ao ano de 2020;
  3. A atualização extraordinária do preço prevista no art.º 70.º da LOE 2020, por falta de regulamentação, impossibilita a sua aplicabilidade face ao princípio da legalidade (art.º 3.º do CPA).

À consideração superior,

 

[1] O facto de o legislador se referir de modo diferente quanto aos prazos de apreciação e de decisão (15 dias para a apreciação e 15 dias úteis para a decisão), é irrelevante, pois que, tratando-se de um prazo administrativo, o mesmo suspende-se nos sábados, domingos e feriados, conforme determinado pela alínea c) do art.º 87.º do CPA.

Data de Entrada
Número do Parecer
2022/007